terça-feira, 25 de novembro de 2008

Circo de luz




Não se pode mais esperar que as crianças, adultos ou quem quer que seja apareçam nos circos, a magia se exauriu na mesma velocidade que os trapezistas perderam o medo (não se perde o medo nas alturas, apenas o enfrenta-se), que os palhaços esqueceram a sinceridade em cima do picadeiro; não quero ir ao circo e ver motoqueiros dentro de um globo de metal girando, nem quero ver elefantes se ajoelhando para o público, quero ir ao circo e ver luz, cor. Agora está na hora de sair debaixo da empanada, deixar que os palhaços corram pelas ruas, que os acrobatas pendurem seus tecidos nas árvores, que os malabaristas joguem nas praças, que a magia sustente as lonas novamente. E quando estiver nas ruas torcer para que a maior quantidade de pessoas esteja assistindo pelo puro prazer de nos sentirmos envolvidos pelo público que contornaria quase todo um picadeiro se estivéssemos em um, nos dando a sensação de estarmos mergulhados em um mar de rostos pasmos.

que o circo de luz cresça cada vez mais.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

A mística do garoto das bolas de gude...

A figura de Deus me vem em todas as coisas, é como a agua numa jarra que ocupa todos os espaços de forma fluída.

Leonardo Boff diz isso como ninguem:

“Captar Deus é tê-lo em todas as dimensões da vida, não apenas em situações privilegiadas, como quando se comunga ou se reza. Ter a experiência de Deus sempre - andando na rua, respirando o ar poluído, alegrando-se, tomando cerveja, procurando entender um texto que se esteja estudando. Deus vem misturado com tudo isto; e qualquer situação é suficientemente boa para captá-lo e dizer:” Ele anda conosco”.
“A chave do místico é procurar ver o que está por trás de cada coisa, o que a constitui e sustenta. Não ficar preso ao superficial, - mas fazer de tudo um símbolo, um sinal, um sacramento, uma imagem”.
“Para quem tem a experiência de Deus, o mundo é uma grande mensagem”.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Falar sem voz.

O dia era meio estranho, as cores pareciam ser outras no mundo que é o picadeiro da minha trupe.
Enquanto eu pensava no numero com fogo que iria fazer pela noite; de longe pela janela, eu via ela; cabelos vermelhos, sentada aos pés da escadaria de uma igreja; as mãos sobre o rosto como quem faz delas lenço, pernas recolhidas encostadas ao corpo.

Chegando mais perto pude ver algumas lágrimas que desciam sem motivo certo.
Não demorou muito pra perceber que era o seu coração que rolava pelo chão.
Perguntei a ela o que tinha acontecido, mas resposta não tive.
Recebi apenas um levantar de cabeça, que me deixou ver o seu olhar quase perdido.
Eu disse:
-garotas lindas de cabelos vermelhos não choram...
ela levantou a cabeça e me devolveu um pequeno sorriso que vinha de algum lugar bem distante dali.
fiquei sentado ao seu lado durante horas sem que falássemos uma única palavra.
Um sorveteiro passou e tomamos sorvete.
Um florista passou e lhe dei rosas.
Ela não mais usava as mãos como lenço, pois não mais chorava.
Olhava para mim com um olhar esperançoso, como um sol que raiara para um novo dia.
Fitei aquele coração que estava no chão aos seus pés por tanto tempo,
Peguei-o, mencionei com gestos entrega-lo de volta a ela, porém, o guardei comigo na lona de circo, que é o meu coração.
Perguntei a ela se naquela noite ela gostaria de assistir ao espetáculo da minha trupe, a resposta veio
com um olhar que ao meu ver parecia positivo.

Durante o resto do dia, meus pensamentos se perdiam na dúvida frustrante que era não saber se aquela garota de cabelos vermelhos iria ao espetáculo. A noite chegou e a praça estava tomada, muita gente mesmo, mas nada dela.

Os números começaram, primeiro os palhaços e malabaristas, depois os acrobatas e estava chegando a minha hora e sem muitas delongas ela chegou. Comecei o número, e enquanto estava ali sendo o centro das atenções do público, meus olhos não paravam de procurá-la. Até que a vi entre as pessoas. Era ela !

Meu coração se encheu de alegria naquele momento, acho que foi um dos melhores números que fiz em toda a minha vida até aquele momento. O espetaculo chegou ao fim e fui me arrumar no trailler o mais rápido possível para ir ao encontro dela, qual não foi a minha surpresa ao -la me esperando na porta, tímida.

Ela olhou para mim, colocou as mão sobre meu coração e o guardou dizendo:
-você falou tudo que eu precisava ouvir sem dizer uma palavra.

Depois desse dia a garota de cabelos vermelhos fugiu com a nossa trupe. E eu e ela agora espalhamos juntos a luz do circo pelo picadeiro do mundo.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Por um Sopro?


Há um tempo que venho percebendo algo estranho com o meu supervisor no trabalho, uma coisa diferente no olhar, um olhar que ao mesmo tempo vê tudo e não vê nada, eu me perguntava se aquilo seria paranóia da minha cabeça. Hoje eu descobri a resposta para isso.
Hoje durante a manhã como de costume cheguei e logo fui ao encontro dele para pegar as chaves do laboratório, tudo parecia normal, menos aquele pesar no olhar, troquei algumas palavras com ele e fui começar a trabalhar. Logo no meio da manhã senti sede, então sai para procurar um bebedouro e encher meu copo, ao longe ouvi o meu supervisor falando alto com alguns funcionários, o que era extremamente estranho, fui chegando mais perto para ver o que estava acontecendo e o vi muito afobado, perguntei a ele com quem deveria deixar as chaves quando eu fosse embora, ele chamou o funcionário e me disse que eu deveria entregá-las a ele. Fomos andando pelo mesmo caminho, ele para ir embora e eu para voltar ao trabalho, na bifurcação de nossos caminhos ele me disse que estava saindo por que iria levar a filhinha de poucos anos ao medico para fazer uns exames; conseqüência de um sopro no coração; foi ai que ao terminar de falar e já saindo ele fez um gesto com o peso de mil palavras; foi uma mistura de batida de coração com sopro, dizendo que ia embora e não voltava mais. Depois daquilo voltei ao trabalho muito perturbado; aquele homem forte nos pensamentos e certo das coisas que fazia parecia ter perdido o chão completamente, sua filhinha pequena não estava bem e precisava dele.
O resto da manhã para mim foi pensando nesse ocorrido, imaginando aquela velha premissa da fragilidade humana; somos pequenos, somos fracos para o mundo, apesar de sermos muitas vezes fortes para nós mesmos, mas para o todo somos algo tão pequeno que ás vezes tenho até medo, não o medo de ser perene de voltar ao pó ou medo das coisas materiais, mas sim o medo das coisas que não se pode ver, como aquilo que o meu supervisor estava sentindo por vários dias por causa da filhinha, sentir aquilo deve doer tanto quanto sofrer um ataque do coração ou levar uma facada. Pergunto-me muito se sentir esses sentimentos é uma dádiva ou uma maldição que essa criancinha levada chamada Deus nos deu, tenho medo dos vivos, não dos mortos.
Não tenho medo das coisas que vejo, tenho das que não vejo.

Passo o dia inteiro fazendo coisas que eu não queria fazer.

São 3 tipos de caras: os conformados, os hipócritas e os "pseudorebeldes"¹.


Após anos de estudo pelos ensinos, fundamental, médio e superior. Hoje acordo, tomo banho, visto-me, tomo café, falo com a família e lá vou eu em direção ao trabalho, pego aquele trânsito nosso de cada dia, então chego finalmente; lá encontro o que não queria encontrar. Olho para todos os lados e só vejo o que não queria ver, pessoas vidradas em suas mesas suando por coisas que não são suas, esperando apenas por um salário; aquela coisa que vem lá daquele negocio de sistema capitalista.

Agora chega a hora do almoço, vou deixar de ver um pouco aquelas caras "bufadas", desço as escadas como um louco para respirar um pouco de ar puro da grande cidade que me espera lá fora; e qual não foi a minha surpresa ao puxar o ar, e perceber que talvez precisasse de um galão de oxigênio, havia me esquecido de como era o mundo do lado de fora do escritório. Identifico ao outro lado da rua aquele rapaz que todos os dias vende salgadinhos, juro que pensei em almoçar, contudo, temos apenas uma hora para o almoço o tempo cada vez mais me toma. Atravessei a rua e fui ao encontro do rapaz, pedi a ele uma coxinha com suco de maracujá para ver se meus ânimos se acalmavam (doce ilusão), terminei de comer, paguei o que devia, olhei para o relógio e já era hora.

O segundo turno do dia é sempre o pior e o melhor, pior porque você já trabalhou no primeiro turno a manhã toda;
(se puder imagine que o cansaço é um bravo e sanguinário guerreiro, e que ele nunca terá piedade de você), entretanto, é o melhor porque o dia de trabalho já está chegando ao fim.
Durante o caminhar desse segundo turno entre um flerte e outro com a nova estagiária, minha mesa se encheu de papeis! O susto foi tamanho, que o pouco café que existia em meu copo sobre a mesa foi parar no chão com a movimentação involuntária causada pelo susto; minhas mãos foram à cabeça por saber que teria de terminar de verificar todos aqueles papeis até o final do expediente; e não mais que de repente, vinha mais uma vez meu chefe me cobrando efusivamente o término de um trabalho do dia anterior, eu não tinha forma melhor de responder a ele do que com um leve balançar negativo de cabeça.

Para dar uma luz ao final do meu dia de trabalho, a estagiária veio falar comigo, ela era alta, ruiva, meiga e usava um vestido que mostrava suas lindas pernas, queria saber onde ficava a copa queria pegar um café, ela parecia estar um pouco cansada da noite anterior, pensei. Mostrei então a ela onde a copa ficava, ela pegou seu café e ficamos conversando durante alguns minutos, até que fomos interrompidos pelo horário do final do expediente que chegava; nossa conversa ficaria para outro dia.

Comecei a juntar minhas coisas na pasta para ir embora, olho no relógio. É hora do engarrafamento. Apresso-me o máximo que posso ao descer as escadas para pegar meu ônibus a tempo de não entrar no maldito engarrafamento, chegando no ponto lotado vejo meu ônibus ao longe, pulo então até o meio fio para ter a certeza que o motorista irá conseguir me ver; para minha sorte eu tinha conseguido chegar a tempo de não haver engarrafamento, mas para o meu azar o ônibus estava lotado (sovacos ao vento meu caro, ao vento !), esgueirando-me entre os perfumes paraguaios, as sacolas de compra, e os fechadores de passagem, consegui um lugar em pé na parte da frente do ônibus. Essa é também além do próprio fato se trabalhar uma das piores partes de se ser um trabalhador com remuneração relativamente média, ter que pegar ônibus extremamente lotados em horários de pico, mas o que se à de fazer?

Chegar em casa depois de um dia desses é o maior dos merecimentos, pois agora eu vou comer, tomar um banho e ir dormir para amanhã, acordar, tomar banho, vestir-me, tomar café, falar com a família e ir em direção ao trabalho, pegar aquele trânsito...

Quem sabe no final disso tudo, eu possa um dia alimentar a minha alma que todos os dias chega em casa murcha seca, sem a água da vida; com um curso de teatro, formando a minha banda , sendo um "rock star", ou quem sabe virando hippie; largar essa vida pré fabricada que eu e mais milhões de caras levam, chamar aquela garota do trabalho pra sair, poder ser e fazer o meu sistema, o sistema humano, nem democrata, comunista ou socialista.

Desculpem-me os conformados e os "pseudorebeldes", mas sou um hipócrita assumido, esperando a hora do bote.

terça-feira, 25 de março de 2008

Formigas e o Tempo



As formigas não tem pulsos, consequentemente não tem relógios e não se preocupam com o tempo, eu não me preocupo com o tempo, mas penso muito nele, formigas não devem pensar nele, devem sentir, elas sentem, não sentem ??
Espero que não sintam, já matei algumas de obesidade quando deixei farelo de biscoito cair no chão do quarto, sinto que as vezes deixo os farelos que pairam na minha mente caírem por ai de esquina em esquina como pedaços de biscoito para as formigas...

Quatro pernas de inocência


Um dia ela parou, pensou e finalmente chegou a conclusão de que era usada por todos; que sempre passavam por ela para conseguir apoio, ou quem sabe um momento de descanso, indo embora sem se quer dizer uma palavra.

Ela temia ser jogada na rua e ir parar em algum lugar sujo e solitário onde não existiria ninguém para usa-lá. Participava sempre dos momentos mais especiais da família, desde o natal até a páscoa. Se torturava por não saber quando a sua imortalidade material acabaria; até que um dia a coisa mais incrível de sua existência aconteceu, um pequeno ser, com sua fala ainda em formação disse com desajeito:" cadeira!".

Ela do fundo do seu ser madeirado tentou de alguma forma emitir um "obrigado", mas para o seu desespero o máximo que conseguiu foi um "nhec-nhec" de madeira velha. Apesar dos pesares, ela sabia que aquele pequeno ser estava agradecido mesmo sem ter escutado suas palavras madeiradas. Daquele dia em diante ela percebeu o porque de estar ali....


como a porta está para abrir e o cadeado para fechar.